Não posso falar deste processo criminal por duas razões:
1. Porque não conheço o processo (e diz-me a experiência que não devo falar de coisas que desconheço);
2. Mesmo que conhecesse os trâmites, o meu Código Deontológico não me permite falar de processos pendentes, e na realidade esta decisão, ainda não transitou em julgado;
Mas posso falar sobre os processos sumários, em direito processual penal, e sobre o crime de injúria ao órgão de soberania Presidente da República. Mas toda a gente ficaria absolutamente entediada.
Como crime público que é, o Ministério Público (MP) tem legitimidade para andar com este processo para a frente. O que significa que as forças da autoridade (que coadjuvam o MP) também podem tomar medidas que vêm no Código de Processo Penal (CPP) como a detenção de cidadão quando apanhado em flagrante delito.
Foi o que aconteceu neste caso de Elvas. O cidadão gritou, em forma de apupo, ao Presidente da República "Vai trabalhar malandro", um agente da PSP estava por perto, deteve-o em flagrante delito, algemou-o em frente aos filhos e levou-o a tribunal para julgamento sumário. A acusação provou-se e a juiz não teve outro remédio senão condená-lo.
Exagerado? Falta de bom senso? Abertura de processos que depois não se podem fechar? Tudo e mais alguma coisa. O problema é que na Justiça não" se dão jeitos", e uma vez aberto um processo (NUIPC - Número Único Individual de Processo Criminal) já não se pode voltar atrás.
Ainda gostava de saber quem é este "Sr. agente" que respira patriotismo e acha que bom senso é deter um cidadão que manda o PR trabalhar, quando este mesmo PR ofende todos os dias os portugueses... Mil vezes levar um processo disciplinar do que deter este cidadão. Mas é este bom senso, coragem, que vão fazendo a distinção entre os cidadãos nos lugares que ocupam.
O agente diz que o cidadão não disse apenas isto contra o PR. Como aquilo que o agente diz faz fé pública a única maneira de deitar o auto de notícia abaixo é apresentar testemunhas que por ali pululavam.
Os tribunais têm de aplicar a Lei, custe o que custar, agrade ou não. É para isso que existem bons advogados. E os bons advogados, mesmo em sumário, pedem prazo para apresentação de prova (que os cidadãos reclamam: isso atrasa a Justiça!); e esgrimam argumentos para excluir a culpa e/ou ilicitude (mais uma sessão e os cidadãos reclamam: isso atrasa a Justiça!).
Cada caso é um caso, e daquilo que conheço este caso tem contornos difíceis de entender, processualmente falando: desde o agente patriota, passando por uma condenação sumária sem qualquer produção de prova, até ao exagero da própria multa. Quanto a esta última a solução é simples: RECORRE-SE (recursos, aquelas peças processuais que os cidadãos entendem como actos dilatórios praticados pelos advogados?! Esses mesmos.)
O Miguel Sousa Tavares também será condenado se chegar a julgamento. A única diferença entre o MST e este cidadão é que o primeiro vai conseguir arquivar o processo ( não por influências, ou amizades ou "jeitos" - já não há paciência para mitos - mas antes porque vai ser representado por um advogado amigo competente que muito provavelmente não lhe levará um cêntimo pelos autos); o segundo muito provavelmente foi representado pelo estagiário que estava de escala no Tribunal de Elvas que saberá q.b. de Processo Penal, mas falta-lhe a estaleca para lidar com um processo que pode e tomou as proporções que tomou.
E no fim é de se perguntar: e o cidadão recorreu? Quer recorrer? Devia. Muitas vezes e apesar de devidamente advertidos, não querem recorrer. Se ele ganhar na Relação de Évora não paga as custas. (Pois que muitas das vezes só se pensa no quantitativo e não no qualitativo).
Para além de ser uma questão de Justiça é também uma maneira de mostrar à pessoa que ocupa o cargo de PR que não o queremos lá, que estamos fartos de tanta incompetência, de tanto desajuste social, de tanta falta de vergonha na cara.
Só para colmatar com a cereja no topo do bolo, no caso MST a queixa foi apresentada pela própria Casa Civil da Presidência da República; neste último caso, a mesma Casa Civil, após a condenação do cidadão, veio, logo, em comunicado dizer que não tinha nada a ver com este caso uma vez que não tinha apresentado queixa.
Este país precisa basicamente de tudo. Uma Revolução a sério, especialmente de valores.
K